Boa vizinhança: saiba o preço do silêncio em áreas dominadas pelo PCC

A negociação permite à organização criminosa ter tranquilidade para fazer valer sua “lei”.

Nas regiões dominadas pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), principalmente nos pontos de venda de drogas localizados nas periferias das cidades, a facção impõe à comunidade e a pessoas ligadas ao crime regras de conduta cujo cumprimento é monitorado sem trégua pelos “disciplinas”.

Investigação da Polícia Civil em Jundiaí, no interior de São Paulo, revela detalhes dessa “política de boa vizinhança”. Em uma comunidade específica, o Morro São Camilo, policiais identificaram como as pessoas “vendem” seu silêncio em troca de segurança e algumas vantagens. A negociação permite à organização criminosa ter tranquilidade para fazer valer sua “lei”.

Ou seja, parte dos moradores da área faz vista grossa para as ações criminosas dos integrantes da maior facção do Brasil — incluindo os “tribunais do crime”, também conhecidos como “tabuleiros”, em que inimigos ou transgressores de regras são levados a uma espécie de júri e podem até ser condenados à morte.

“Como todos sabem, nestas comunidades de baixa renda, as pessoas acabam procurando os líderes do crime para obter favores e vantagens, em troca de colaboração e silêncio. É a política da boa vizinhança, onde as pessoas vendem seu silêncio por conta de alguma ajuda financeira ou favores especiais”, diz trecho de relatório policial, obtido pelo Metrópoles.

Os favores podem incluir a punição de supostos infratores, ou desafetos dos solicitantes, que apelam à “justiça paralela” do PCC, a qual age rápido, sem burocracia e por vezes com pena de morte.

As demandas são levadas aos disciplinas da facção, que as avaliam e compartilham com instâncias criminosas superiores.

A criação dos disciplinas

Investigações do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de São Paulo (MPSP), mostram que Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, descentralizou as ações financeiras do PCC, dividindo-as em células, ligadas a outras maiores, que chegam a um núcleo central.

A figura do disciplina nasceu para servir como uma espécie de “corregedor” das ações financeiras do PCC. Com o tempo, o disciplina passou a julgar qualquer demanda apresentada, como se fosse um sistema de justiça marginal, pautado nos preceitos da facção. Foi assim que nasceram os tribunais do crime.

Segundo as investigações, cada comunidade tem, atualmente, o seu disciplina. Eles recebem as queixas dos moradores, ouvem testemunhas, coletam provas e marcam uma data para o julgamento.

Os “réus” são intimados verbalmente ou por mensagens de celular, com dia e horário para se apresentarem ao “tribunal”. Eles podem apresentar suas defesas e também levar testemunhas.

Há registros de que réus são torturados para assumir crimes, mesmo que testemunhas digam que eles são inocentes.

Também existem casos em que mentiras norteiam as deliberações, resultando em sentenças de mortes, também aplicadas a inimigos e para membros da própria facção.

Enterrados vivos

Foi o que aconteceu com quatro membros do PCC de Jundiaí. Dos quatro mortos, três foram enterrados ainda vivos. Todos eles tiveram a morte decretada em um tribunal do crime.

Os corpos de William Adão, Gabriel Pereira dos Santos e José André de Souza Santos estavam em uma mesma cova rasa, no bairro Engordadouro, em Jundiaí.

 

 

Por Metropoles

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